sábado, 25 de setembro de 2010

Da capacidade de tecer o próprio mundo...




“Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.
Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.
[...]Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.”



O trecho faz parte do primoroso conto de Marina Colasanti intitulado “A Moça Tecelã”. O texto, extremamente dotado de sensibilidade, apresenta uma jovem que costuma tecer exaustivamente. Ela tece, tece e tece. A máquina de tecer é sua única e mais fiel companhia. Eis que certo dia a moça descobre ser detentora de um dom muito especial: seus sonhos poderiam se tornar realidade por meio dos fios de sua máquina de tecer, isto a faz construir um mundo ideal a sua volta.

Ela tinha tudo. Porém, ao sentir-se dominada por uma desamparada solidão, resolve criar um marido, utilizando-se dos fios mais fortes, belos e nobres. Surgem muitos planos e sonhos. Ela idealiza uma vida perfeita ao lado do companheiro desenhado conforme seus ideais.

O homem, no entanto, ao perceber a habilidade da moça, cresceu em ambição, mal que o levou a trancafiá-la e exigir coisas absurdas. O tão desejado amor não mais existia. Tornou-se pesadelo.

Perspicaz, a moça decide desfazer-se de toda a riqueza inútil e do próprio companheiro que outrora criara por meio de seus fios. Ela destece tudo e reencontra a felicidade, escondida no canto dos pássaros durante a manhã, no balançar das árvores e em toda a simplicidade que a envolvia, mas que havia sido esquecida mediante a riqueza e a maldade do opressor.

O conto nos leva a refletir sobre questões tangíveis à condição humana. Muitas vezes construímos imagens ideais do mundo que nos cerca. Mas o que não percebemos é que aquilo que seria “ideal” nem sempre é o “certo”. Na qualidade de seres pensantes, temos o magnífico dom de tecer nosso próprio mundo. O tecemos a nossa maneira. Prescindimos, no entanto, do real valor significativo das pequenas coisas; esquecemos da simplicidade que gratuitamente embeleza cada instante.

A busca pelo sucesso nos leva a, incondicionalmente, buscar a perfeição. Ao exigirmos muito de nós mesmos passamos a ignorar o mundo que nos cerca. É válido reservar alguns instantes para destecer um mundo idealizado e passar a confrontar a realidade tal como ela é. Deixar, ao menos um pouco, de viver utopicamente pode ser válido e é um bom passo para a busca da tão almeja felicidade, aspirada por todo ser humano. Somos tecelões de nossa própria história. Saibamos selecionar fios nobres e consistentes. A escolha é nossa...

domingo, 19 de setembro de 2010

Me apaixonei por Clarice Lispector. Ela apareceu meio que por acaso em um momento de minha vida no qual suas palavras agiram terapeuticamente. Mulher de garra, mulher sensível, mulher batalhadora. Mulher. Simplesmente mulher. Cada palavra sua tem a capacidade de tocar profundamente no coração. Ela consegue limpar as impurezas que surgem e afligem este músculo tão necessário a nossa existência.

Para Clarice, tudo é possível. Por meio de seus dizeres sublimes, uma tal Macabéa pôde acreditar em si mesma, mesmo após a barbárie, conquistando seu lugar... sua estrela.

Ao ler Clarice, penso que é possível tocar as estrelas do céu. Ela transmite confiança em mim mesmo. Ela consegue fazer germinar as sementes do bem que possuo em mim mesmo. Ela faz brotar de mim aquilo que tenho de melhor, e transmitir ao mundo meus mais genuínos sentimentos...

Dedico este espaço à Clarice: poetiza... Mulher...




Já escondi um AMOR com medo de perdê-lo, já perdi um AMOR por escondê-lo.
Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.

Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso.
Já passei noites chorando até pegar no sono, já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.

Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.
Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.
Já passei horas na frente do espelho tentando descobrir quem sou, já tive tanta certeza de mim, ao ponto de querer sumir.

Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi.
Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta em meu canto.

Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir.
Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.

Já tive crises de riso quando não podia.
Já quebrei pratos, copos e vasos, de raiva.
Já senti muita falta de alguém, mas nunca lhe disse.
Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar.
Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros.

Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.

Já contei piadas e mais piadas sem graça, apenas para ver um amigo feliz.
Já inventei histórias com final feliz para dar esperança a quem precisava.
Já sonhei demais, ao ponto de confundir com a realidade... Já tive medo do escuro, hoje no escuro "me acho, me agacho, fico ali".

Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais.

Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria.
Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.

Já chamei pela mamãe no meio da noite fugindo de um pesadelo. Mas ela não apareceu e foi um pesadelo maior ainda.

Já chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim.
Não me dêem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre.

Não me mostre o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração!
Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente!

Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra SEMPRE!

Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das idéias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes.
Tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.

Você pode até me empurrar de um penhasco q eu vou dizer:
- E daí? EU ADORO VOAR!

domingo, 12 de setembro de 2010

Primeiros Versos (3)

Este espaço se dedica ao relato de imagens observadas no cotidiano...



Lá estava ela sentada na varanda vendo a vida passar. Retratos do passado a atormentavam, ao mesmo tempo em que a faziam recordar bons momentos vividos. Realidade distante era o sorriso que carregava nos lábios. Sorriso farto, acolhedor, fraterno e compassivo. Tudo mudou... As gargalhadas deram lugar a um ar sombrio, cansado, lúgubre.
As imagens de outrora foram apagadas desde o momento daquela partida... Viver, então, tornou-se para aquela criatura apenas uma obrigação. Martírio. Como mais um corpo inerte fadado ao fracasso, costuma plantar a cada instante as sementes do desespero e da angústia. Há de colhê-los...

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Quem acompanha este espaço já deve ter percebido que sou um grande admirador da literatura. Sendo assim, gosto de compartilhar com meus leitores textos que leio e que geram em mim algum tipo de sentimento. Há pouco tempo, tive a oportunidade de conhecer um poeta potiguar de inteligência inigualável, como é de praxe ao povo daquela região. Ele escreve com o coração e, sobretudo, com a alma. É de autoria desse meu amigo os versos abaixo. Simples, singelo, belo e profundo... Escrever não é ofício para qualquer um; é preciso ter algo especial...


AMADO


Por Rômulo Gomes*




Quando a comida perder o sabor,
As cores desbotarem,
O doente não sentir dor e
Os raios do sol tão forte brilharem,
Não adianta se esconder,
Não adianta chorar,
Não adianta correr:
É só amar.






(*) Rômulo Gomes é um santanense apaixonado por literatura,
poesia. Está no 6° período do curso de Letras/Português – UERN/Assu
e trabalha atualmente como Vice-Diretor numa escola do município de Santana
do Matos (cidade da região central do estado do RN)

domingo, 5 de setembro de 2010

Tempos de Inocência...

Hoje resolvi me livrar das coisas supérfluas do passado. Nada melhor do que reservar um tempinho para remoer coisas antigas. Encontrei resquícios de um tempo bom no qual imperava a inocência de um jovem estudante sonhador. Textos, imagens, desenhos... Tudo revela os sonhos daquela criança que ficou para trás. É incrível notar como o pensamento e as ideias evoluem! Realmente a lei natural das coisas de fato existe. Jamais seremos hoje o que fomos ontem.

Ao vasculhar as páginas de um velho caderno percebi o início de minha vocação para a área de humanidades. Enquanto as atividades avaliativas de matemática oscilavam com notas satisfatórias apenas para se “passar de ano”, as referentes à português e literatura eram acompanhadas de imensos recados elogiosos de meus mestres... Penso que certas destrezas são dons inatos.

Como já disse Rubem Alves, “todo texto prazeroso conta uma mentira. Ele esconde as dores da gestação e do parto”. Era justamente isso que eu fazia no passado: inventava realidades; divulgava no papel aquilo que gostaria de viver e que as pessoas vivenciassem... Talvez fosse isso que me proporcionava tanto prazer pela arte de escreve: sonhar, descobrir mundos, dar possibilidades... Que bons foram os tempos de inocência... Mas tudo muda... Tudo passa...Nada será do jeito que já foi um dia...