terça-feira, 21 de junho de 2011

Na rodoviária, o abandono...

Ela estava sentada no banco da rodoviária naquela madrugada fria. Não me recordo o dia da semana. A manhã estava cinzenta, um tanto que deslocada do tempo. Apressado eu estava, mas aquele olhar triste me chamou a atenção e me fez parar por um instante e refletir. De onde vinha aquela criatura? Que histórias ela tinha para contar?

Seus cabelos brancos denunciavam experiência de vida. As mãos calejadas demonstravam longos tempos de trabalho intenso, a fim, talvez, de manter o sustento dos filhos. Será que ela tinha filhos? Por que será que estava ali, abandonada no frio? O que tinha deixado para trás? Será que alguém um dia já parou por um momento e a olhou nos olhos, como eu fiz naquele instante, mesmo que de forma rápida?

Na rodoviária vidas se cruzam de forma absurdamente veloz. Histórias de vida se esbarram toda hora! É um ir e vir permanente, no qual as pessoas chegam e vão embora... Medos, frustrações, alegrias e tristezas se confluem em uma confusão cósmica completamente surreal. Na rodoviária a vida se dá de forma desconecta e efêmera. Mas aquele rosto me cativou... Me fez parar pelo caminho corrido do meu dia e simplesmente contemplar. Foi rápido, mas a contemplei.

Contemplei seus cabelos brancos. Contemplei seus olhos marejados (o que será que já viram?). Contemplei sua frágil pele (o peso dos anos evidenciava-se). Devolvi a ela a condição de ser humano, pelo olhar humano que a concedi. A enxerguei com dignidade e respeito. Procurei imaginar o que já plantara e colhera nos jardins da vida, buscando respostas internas para os motivos que ocasionaram o extermínio de suas flores.

Ao compreender a fragilidade daquela mulher, me dei conta também de minha própria fragilidade. Tenho limitações inerentes a qualquer ser humano que sente vontade de mudar o mundo, mas não é capaz de fazê-lo. As faces do abandono daquele ser talvez sejam reflexos de uma sociedade injusta e excludente. Ou, talvez, seja motivo de desilusões da vida. Pois como diz a música, “cada um sabe a dor e a alegria de ser o que é...”