
Sou grande admirador do cinema não convencional, traduzido aqui como filmes produzidos fora de Hollywood. De uns tempos para cá tenho ignorado os blockbusters carregados de shows de imagens e fenômenos de bilheteria. Tenho escolhido obras mais reflexivas, não me importando muito, é claro, com qualidade técnica.
O cineasta espanhol Pedro Almodóvar é um de meus favoritos. Descobri o diretor por meio do filme “Carne Trêmula” e, a partir deste, passei a buscar outras produções conduzidas por ele. O que mais me atrai é o exagero temático de suas obras, que beiram ao absurdo. No entanto, paradoxalmente, a maior parte dos filmes retrata as mazelas da condição humana, que são acompanhadas, ironicamente, de um colorido intenso e enjoativo.
O filme mais recente, isto é, o último a que assisti, é “Má Educação” (La Mala Educación). Diferentemente da maioria de suas obras, nesta o diretor mergulha a fundo no universo masculino. Os críticos consideram este o filme mais pessoal da carreira de Almodóvar, no qual o cineasta expressa sua paixão pelo cinema.
Ignácio Rodriguez (Gael Garcia Bernal) é um diretor de cinema ávido por encontrar um enredo cativante para sua nova produção. Quando criança, Ignácio foi educado em um colégio de padres não tão santos como deveriam de ser (é comum Almodóvar tecer críticas à Igreja Católica). Além de sua paixão pela música e pela arte, Ignácio sentia-se atraído pelo colega de classe Enrique Serrano (Felez Martinez); esta inocente paixão infantil despertava a fúria do diretor da escola, Padre Manolo, que mantinha obsessivo interesse por Ignácio.
Estas histórias de amores passados fazem com que Enrique Serrano, agora ator, retorne à vida de Ignácio, propondo um roteiro para a nova produção do diretor. Entretanto, o roteiro expressava a realidade vivida pelos protagonistas enquanto jovens e, muito mais do que isso, desencadeava revelações alarmantes. Como é normal nas obras de Almodóvar, nem todos são o que aparentam ser.
As cálidas cenas entre homossexuais, travestis e o diabo a quatro servem apenas para polemizar o filme, artimanha inteligente utilizada para atrair o público e a crítica. E deu certo. A cena da piscina é considerada uma das melhores sacadas do cinema mundial.
O filme possui enredo não-linear, o que leva o espectador a confundir (ou relacionar) ficção e realidade. É uma verdadeira homenagem de Almodóvar ao cinema noir, no qual surgem descobertas inimagináveis advindas de um passado sombrio. Há um filme sendo produzido dentro do próprio filme e, a partir daí, aparecem revelações surpreendentes, no melhor estilo polêmico de Almodóvar. É uma obra para se assistir de olhos bem abertos, afinal, todos usamos máscaras.