segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Sem Máscaras: De Olhos Bem Fechados

O texto abaixo foi publicado na edição de 20 de dezembro no jornal Folha da Região. Confira:





Existe uma linha tênue que segrega sonho e realidade. Relações sociais se dão por meio de máscaras capazes de ocultar a imperfeição humana. Absolutamente nada é o que parece ser. Estas são algumas das temáticas utilizadas por Stanley Kubrick em seu último trabalho, “De Olhos Bem Fechados” (Eyes Wide Shut, EUA, 1999).

A narrativa é lenta, estratégia utilizada por Kubrick para levar o espectador a adentrar-se ao íntimo de cada personagem retratada. Alice (Nicole Kidman) e Bill (Tom Cruise) representam um típico casal americano aparentemente perfeito. Após uma discussão, a mulher, sob efeito de entorpecentes, revela ao marido que já teve fantasias sexuais com outro homem. O fetiche jamais foi consumado, mas a revelação desencadeia em Bill um estado de frenesi.

A discussão é o mote para que o bem sucedido médico passe a vagar pelas ruas da excêntrica Nova York com o intuito de se recompor. A partir daí, Bill se depara com uma série de situações surreais, inusitadas e perturbadoras, que o levam a uma louca “viagem” pelos instintos humanos. Absolutamente nenhuma personagem que cruza o caminho do protagonista detém a virtude da sanidade.

A noite de Bill é o ponto crucial no qual Kubrick apresenta sequências dotadas de mistério e perfeição. Com elegância sem precedentes na história do cinema, é revelado um macabro ritual erótico-religioso. Na celebração, todos os participantes se ocultam por meio de máscaras. A orgia ritualística é cuidadosamente retratada. Não existe espaço para vulgaridades. A intenção aqui é demonstrar seres humanos literalmente despidos, sem as máscaras da hipocrisia.

O mistério é latente a cada cena. Os diálogos longos são acrescidos de trilha sonora milimetricamente bem selecionada, capaz de gerar apreensão. O som das insistentes marteladas nas teclas de piano somado à iluminação enigmática faz de “De olhos Bem Fechados” uma produção de inquestionável peculiaridade.

Não é um filme para se ver uma vez só, dado o fato de estar a anos-luz de distância das produções clichês de fácil compreensão que têm dominado a indústria cinematográfica mundial. Um grande drama psicológico que revela características inerentes a qualquer bom samaritano. Uma obra prima que induz o espectador a desconstruir estereótipos sobre si mesmo.

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