quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

TEMPO

O tempo é algo absurdamente ingrato. Às vezes voa ao ponto de não percebermos sua passagem... No entanto deixa marcas. O tempo é capaz de causar frustração. Planejamos muitas coisas a serem feitas no decorrer da vida, no entanto, o algoz tempo não colabora. Faz questão de passar correndo e nos dar uma rasteira, impossibilitando que concretizemos aquilo que idealizamos.
Mais um ano vai embora... Passou tão depressa que a impressão que fica é que praticamente não vivemos! Parece que muita coisa ficou para trás! Esta velocidade sem igual gera estas impressões que, não são reais, mas garantem certa dose de apreensão e, por consequência, uma dolorosa sensação de frustração.
Porém, sou muito grato a 2011. Foi um ano de reflexão. Após a conclusão da faculdade e do meu estágio, parei e refleti. Coloquei tudo na balança. Refleti sobre erros e acertos, perdas e ganhos... Tive experiências profissionais diferentes da minha área de formação, que me ajudaram a perceber que realmente só sei trabalhar como jornalista... Conheci pessoas que somaram muito em minha vida... Amei... Pude me aprofundar em conhecimentos religiosos que preencheram minha alma... Pude estar mais próximo da família... Enfim... Os ganhos foram muitos no ano de 2011.
Agora resta esperar a chegada de 2012, tendo como único arsenal a esperança! Arsenal que nos ajudará a enfrentar os desafios que estão por vir. Seja bem vindo, 2012!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Feliz Natal (de verdade)



Comemorar o natal e ao mesmo tempo ignorar a realidade do mundo soaria como atitude minimamente hipócrita. Nesta época do ano é comum nos depararmos com atitudes que, em outros momentos do ano dificilmente acontecem. Para atender àquilo que o capitalismo ou sei lá o que pregam, parece que certo amor que não sei de onde vem invade o coração das pessoas.

Patrões que passam o ano todo humilhando e explorando funcionários os presenteia com panetones, confraternizações e afins; pessoas fazem “vaquinhas” para entregar cestas básicas aos que necessitam, como se a fome tivesse tempo pré-determinado para ser cessada; pessoas que mal se falam durante o ano todo se abraçam e desejam boas festas... Enfim, a hipocrisia rola solta!

No entanto, não é só de ceticismo que vive este blogueiro que, por sinal, há tempos não passa por aqui. Acredito que o Natal resgata sentimentos que deveriam ser valorizados nos 365 dias do ano. São atitudes básicas de humanidade que não podem ser prescindidas. Atitudes que, se praticadas com maior freqüência, tornaria o mundo um pouco melhor. O Natal poderia se estender por todo o ano, para que as pessoas passassem a “amolecer” o coração como fazem nesta época do ano.

Nunca fui adepto às comemorações de festas natalinas. Participo mais por convenção social. É muito bom sim estar em família, no entanto, acredito que também possamos comemorar juntos em outras ocasiões.

Dou mais valor ao que a maioria das pessoas, em virtude do consumismo voraz motivado pelo capitalismo nesta época do ano, acaba esquecendo: o grande mistério da encarnação de Deus, que assumiu inteiramente a condição humana, sobretudo as imperfeições. Ele veio como luz para iluminar as trevas da humanidade que havia perdido a esperança. É este o sentimento que deve nortear nossa vida, a fim de que saibamos manter olhar esperançoso frente ao mundo e, assim, estender para toda a existência os sentimentos natalinos.

sábado, 30 de julho de 2011

A imagem ideal do Divino

Antes de dizer amém em suas casas e lugares de oração, pensem, pensem e lembrem-se, existe uma criança ouvindo – Mary Griffity

Existe uma lógica que normatiza a expressão de nossa fé. Este costume nos é imposto desde o momento em que nascemos. Aprendemos os nomes de Deus, a temê-lo, a evitar que Ele nos castigue, a como experimentar nossa espiritualidade, enfim. Nossa relação com o divino é intermediada por meio de fórmulas prontas com as quais o diálogo com Deus é “facilitado”. Este tipo de religiosidade/espiritualidade revela uma lógica opressora, visto que nos aprisiona a nós mesmos, impedindo-nos de buscar o sagrado em sua verdadeira essência.

Nossa capacidade de descobrir a espiritualidade por meio do caminho da vida é cerceada à medida que nos é imposta a imagem de um Deus soberano, distante da realidade e todo-poderoso. Especialmente na infância, a imagem de Deus que é construída na mentalidade das pessoas é de um Pai austero que castiga seus filhos quando estes se desviam de regras tidas como verdades universais. Tal imagem é embutida no indivíduo, que cresce com esta visão do Sagrado. Este é um dos maiores causadores de toda a opressão que assola o mundo.

A existência de alguém que possui as rédeas da situação e a controla por meio de mecanismos opressores pressupõe medo e, por consequência, conformismo por parte da sociedade. A capacidade do ser humano de raciocinar, argumentar e se opor a preceitos impostos é subtraída.

A construção da imagem de um Deus opressor serve para esconder as opressões causadas pela própria humanidade. Colocar a culpa em Deus pelos equívocos e preconceitos sociais é mais cômodo. Sendo assim, instituições religiosas formulam suas prescrições a fim de edificar uma sociedade ideal para elas mesmas, isto é, benéfica para uma singela parcela da sociedade. O que é certo e o que é errado condizem unicamente com os ideais daqueles que controlam. O patriarcalismo impera.

No entanto, o que tudo isso tem a ver com a frase de Mary Griffity? É na educação nos primeiros anos de vida que a personalidade do ser humano vai sendo aos poucos moldada. A partir daí, o indivíduo cria capacidade e autonomia de discernir os caminhos a se seguir. Se continuarmos a dizer “amém” na frente das crianças a um Deus opressor, perpetuaremos a existência de uma sociedade que isola, exclui e prega preconceitos.

Por outro lado, se a imagem do divino for construída junto com a criança, a partir dela mesma e do universo no qual vive, os benefícios e as delícias desta descoberta se expandirão mundo afora. Talvez esse “despertar” possa ser um dos ingredientes para tornar o mundo um pouco melhor. Assim como disse Rubem Alves:

Minha infância foi uma infância feliz. [...]
Não era preciso dizer os nomes dos deuses nem eu os sabia.
O Sagrado aparecia, sem nome, no capim, nos pássaros, nos riachos,
Na chuva, nas árvores, nas nuvens, nos animais,
Isso me dava alegria!
Como no paraíso [...]

terça-feira, 21 de junho de 2011

Na rodoviária, o abandono...

Ela estava sentada no banco da rodoviária naquela madrugada fria. Não me recordo o dia da semana. A manhã estava cinzenta, um tanto que deslocada do tempo. Apressado eu estava, mas aquele olhar triste me chamou a atenção e me fez parar por um instante e refletir. De onde vinha aquela criatura? Que histórias ela tinha para contar?

Seus cabelos brancos denunciavam experiência de vida. As mãos calejadas demonstravam longos tempos de trabalho intenso, a fim, talvez, de manter o sustento dos filhos. Será que ela tinha filhos? Por que será que estava ali, abandonada no frio? O que tinha deixado para trás? Será que alguém um dia já parou por um momento e a olhou nos olhos, como eu fiz naquele instante, mesmo que de forma rápida?

Na rodoviária vidas se cruzam de forma absurdamente veloz. Histórias de vida se esbarram toda hora! É um ir e vir permanente, no qual as pessoas chegam e vão embora... Medos, frustrações, alegrias e tristezas se confluem em uma confusão cósmica completamente surreal. Na rodoviária a vida se dá de forma desconecta e efêmera. Mas aquele rosto me cativou... Me fez parar pelo caminho corrido do meu dia e simplesmente contemplar. Foi rápido, mas a contemplei.

Contemplei seus cabelos brancos. Contemplei seus olhos marejados (o que será que já viram?). Contemplei sua frágil pele (o peso dos anos evidenciava-se). Devolvi a ela a condição de ser humano, pelo olhar humano que a concedi. A enxerguei com dignidade e respeito. Procurei imaginar o que já plantara e colhera nos jardins da vida, buscando respostas internas para os motivos que ocasionaram o extermínio de suas flores.

Ao compreender a fragilidade daquela mulher, me dei conta também de minha própria fragilidade. Tenho limitações inerentes a qualquer ser humano que sente vontade de mudar o mundo, mas não é capaz de fazê-lo. As faces do abandono daquele ser talvez sejam reflexos de uma sociedade injusta e excludente. Ou, talvez, seja motivo de desilusões da vida. Pois como diz a música, “cada um sabe a dor e a alegria de ser o que é...”

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Pedaços de vida em minhas mãos



Meu desejo era agarrar nos braços dela e puxá-la de volta para a vida. Os últimos acontecimentos a fizeram sucumbir num estado de letargia outrora jamais experimentado. Antes dona de si, agora estava completamente derrotada. O motivo: roubaram dela sua essência, suas cores... A sequestraram simbolicamente, o que chega a ser mais abominável do que o sequestro físico. Quando se trata de sequestro da subjetividade, não existe valor que pague o resgate.

Ela e eu somos dois em um só ser. Nossas vidas se misturam a ponto de eu, inexplicavelmente, sentir as dores dela. Ela está em minhas mãos. Sou o responsável por redigir os versos que influem na vida dela. Sou dono dela. Se ela sucumbe neste momento, não existe outro culpado na história a não ser eu mesmo. O sentimento que tenho com relação a ela: pena. A meu ver, se trata de uma figura digna da mais sincera piedade, pois está em minhas mãos. Ao mesmo tempo em que quero tomá-la em meus braços como uma mãe embala um filho, tenho vontade de abandoná-la na escuridão, para depois ter a oportunidade de chacoalhá-la e agredi-la para que acorde para a vida.

Minha criatura sofre por minha causa, mas, não me sinto culpado por ter seu destino em minhas mãos. Para alguns isso pode ressoar como um sentimento sádico de minha parte, porém, minha falta de piedade com relação a esta criatura se deve única e exclusivamente pelas características dela que se assemelham a mim. As fraquezas dela são minhas fraquezas. Isso me causa angústia. Raiva.

A personagem que construí era dona de si. Sensata, perspicaz e inteligente, esbanjava simpatia e brilho por onde quer que passasse. As pessoas se sentiam bem ao estarem a seu lado. Desejavam tê-la como amiga, psicóloga, companheira. Todos tiravam proveito de sua inteligência ímpar e inestimável.

Gradativamente estas virtudes se transformaram na grande desgraça de minha criatura. Seu encanto a impedia de conquistar o amor. Todos a superestimavam como a pessoa perfeita. Tais rótulos foram os motivos de sua solidão. De tão perfeita que era, acreditava que tinha o direito de ser amada. Ela tinha amor para dar. E desejava depositar suas doses de afeto em alguém. Entretanto, jogaram seu amor às traças, que o corroeram.

Minha criatura era tão peculiar que tudo o que sentia, sentia em dobro. Era toda essência, toda sentimento. Se era para ser feliz, ficava feliz em dobro, mas, se a tristeza batesse à sua porta, ela escancarava para que a maldita entrasse e roubasse cada espaço dos cômodos de sua alma. Tola. Pobre tola...

Fraca. Ah, como minha criatura era paradoxal. A criei imponente, mas preferiu dar espaço para que roubassem dela o que tinha de melhor. Suas melhores cores foram levadas embora. Tornou-se inteira preta e branca. Incolor.

Como criador o que me resta fazer? Chacoalhá-la e trazê-la de volta para a vida. Reanimá-la. Apresentar um novo jardim cujas flores estão se abrindo para o sol. E dizer baixinho eu seu ouvido coisas do tipo: “você tem muito a oferecer... Feliz daquele que puder desfrutar de seu amor... O mundo precisa de você...”

Enfim, sou responsável pelo destino desta pobre criatura que desfalece sem brilho. Tolhi seu direito à vida, mas prometo reanimá-la aos poucos. Já tenho as tintas necessárias para devolver suas cores. Grande responsabilidade. Bela dádiva. Sou escritor de vidas...

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Nossas Palavras...


Palavras... Palavras transformam. Palavras têm o poder de expressar sentimentos verdadeiros, aqueles oriundos da alma. No entanto, Palavras são dialéticas. Ao mesmo tempo em que são vastas e profundas, são limitadas. De paradoxos são feitas as Palavras...

Se existe no mundo uma forma de se atingir o espírito, isto se dá por meio de Palavras. Foi este artifício utilizado até mesmo pelas primeiras civilizações, que utilizaram a Palavra de Deus para atingirem objetivos previamente traçados. É verdade que Palavra tem poder. Palavra pode manipular... Pode encantar... Mas também pode desencantar...

Para os poetas, as Palavras são ferramentas de trabalho. Para se praticar tal ofício, é necessário saber manejá-las com afinco. Palavras não são manipuladas manualmente, pelo contrário, apenas sentimentos podem agarrá-las e distribuí-las em seus devidos lugares...

Palavras são perigosas. Se colocadas em lugares errados então, nem se fala! O segredo que habita a essência das Palavras pode ser desvendado por meio da interpretação. Infelizmente não são todos os seres humanos que detêm a efetiva capacidade de interpretar. Interpretação requer, sobretudo, humanização. E, claro, sabemos que as pessoas são limitadas, assim como as Palavras. Limitação esta que se estende a capacidade de interpretar determinadas Palavras. Às vezes, o significado se encontra nas entrelinhas. E felizes são aqueles que conseguem captar as mensagens!

Arrisco-me a me colocar defronte as Palavras... Posso manejá-las à medida que meus sentimentos interagem e me conduzem a escolher aquelas que realmente possam expressar minha essência. É sinérgica a forma pela qual esboçamos, nas entrelinhas, as mensagens que queremos transmitir aos quatro ventos.

Experimentar a sinergia requer um pouco de esforço... É necessária a capacidade de arrancar o véu que embaça a visão... É preciso ambivalência: a capacidade de olhar para todos os campos da visão. Mas, não basta olhar com os olhos, é preciso olhar com o coração, para que a verdadeira Palavra possa agir: a Palavra de cada um/a de nós...

terça-feira, 17 de maio de 2011

Janela


Sozinha estava ela parada na janela vendo a vida passar. O tédio havia tomado conta daquele pobre coração abandonado... Tivera tudo. Hoje, não tinha nada. Sua única alegria era ver as folhas secas sendo derrubadas pela força do outono frio. Ah, outono... O outono e suas recordações... Para ela, esta estação era um misto de alegria e tristeza.

Recordava-se de passagens de vida que vinham como flashes em sua mente. Momentos que contribuíram para a construção de uma personalidade excêntrica e solitária. No passado, houvera redenção, pois acreditava em sonhos. Hoje, restam apenas esperança de que o final da caminhada se aproxima. A crença de outrora, na qual confiava na luz que emana das trevas, deu lugar a um ceticismo pessimista sem perspectiva de futuro.

Ela havia traçado projetos que valiam mais do que sua própria vida. Mas, no decorrer dos dias, percebeu que caminhava sozinha e em direção contrária aos acontecimentos. O mundo havia se transformado em um verdadeiro caos. O fato de caminhar na direção oposta a levou a ser taxada como maluca, o que de fato aconteceu. Tornou-se sozinha e maluca!

Agora, restava apenas esperar... Esperar eternamente por algo que, acreditava ela, haveria de surgir... Uma espera cruel e cansativa, porém necessária. Mas o que a mantinha firme, ali em frente à janela, eram nacos de esperanças que brotavam de dentro da alma como uma pequena chama prestes a ser apagada, mas que ainda aquece... Utopias de um dia fazer valer à pena... Ela descobriu o valor de uma janela: ali, estática, sempre vendo a vida passar; ela não queria ser uma simples janela... Queria poder pular e transformar o ciclo natural da vida. Ela queria apenas ser mais... E este desejo a consumia!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Entre Escolhas e Marcas. De como vou compreendendo a essência...

A vida é uma caixinha de surpresas. Perdão começar um texto com um pensamento tão comum e simplista. Isso pode até desanimar e induzir o leitor a parar a leitura por aqui mesmo. Mas esta frase revela dimensões grandiosas. É... De surpresas a vida se faz! Somos surpreendidos em todos os momentos, sendo que os maiores responsáveis por estas surpresas somos nós mesmos. Basta que nos deparemos com possibilidade de fazer escolhas. E que haja discernimento! Uma das maiores dificuldades do ser humano, a meu ver, é escolher!

O raciocínio é simples. Imagine-se na seguinte situação: uma longa estrada. Logo à frente, uma placa com duas flechas indicando a possibilidade de seguir a estrada da direita ou da esquerda. O resultado disso: muita confusão! Esse atordoamento mental acontece devido às limitações enraizadas em cada ser humano, sendo a maior delas o medo de errar. Não seria para menos, visto que alguns erros podem repercutir por toda uma vida. Basta escolher o caminho errado.

Durante as fases da vida, somos levados a fazer escolhas. Isso é inevitável. Algumas dessas escolhas vêm mascaradas com a possibilidade de partida. Trilhar novos rumos passa a ser inevitável, visto que o ser humano tem a capacidade de sempre buscar ser mais. Mudanças, despedidas e dor são termos que se combinam.

Como uma viagem de trem, é a vida. Constantemente chegamos à estação, deixamos o vagão e novos aventureiros seguirão viagem. Subimos em outro vagão para trilharmos outro caminho e, no percurso, encontramos outros viajantes, que passarão a compor nossa história, deixando marcas. Inevitavelmente, ao término dessa viagem, chegamos ao destino e buscaremos outro rumo, deixando para traz aqueles que conhecemos, levando no coração somente as marcas que deixaram... Assim é o ciclo da vida. Se repete a cada instante.

Ao nos depararmos com a possibilidade de escolhas, devemos criar forças. Uma força que brota do mais profundo âmago da alma, que nos leva a nos desprender de ideologias enraizadas. Escolher pressupõe mudança de atitude e desprendimento. Requer esvaziamento de ego. Requer, sobretudo, desapego.

Devido à necessidade de mudar, as relações se tornam cada vez mais descartáveis, visto que as pessoas apenas passam por nossas vidas. Entretanto, as marcas que deixam duram eternamente.


Maria Rita expressa o "Destino" como ninguém na canção abaixo... Confira e sinta...


sábado, 23 de abril de 2011

Desabafos e rabiscos...



Deslocado do mundo às vezes me sinto. Se me oferecem quente ou frio, opto pelo morno. Sempre fui assim. Difícil. Porém intenso, o que me salva de ser um grande chato. Quando sinto algo, sinto de verdade, com os cinco sentidos mais um (o sexto). Por isso às vezes sofro. É difícil encontrar quem compreenda.

Certas atitudes típicas dos seres humanos me revoltam. Há pessoas que pensam que o mundo gira única e exclusivamente ao redor de seus próprios umbigos. Determinados indivíduos conseguem a façanha de transformar uma simples garoa em uma tempestade devastadora. Será que é tão difícil deixar-se guiar pelo bem senso? Para os insensatos, sim, é árduo.

Cheguei à conclusão de que o ambiente de trabalho pode ser facilmente transformado em uma extensão do inferno. A receita para esta transfiguração cruel é bem simples: junte pessoas que só pensam em lucro, acrescente uma pitada de pressão, delegue para a função de líderes pessoas sem espírito de liderança e sem noção alguma de humanidade. Pronto: basta servir o banquete infernal.

Este espaço foi criado para desabafos e pontos de vista. À medida que vomito as palavras, meu estado de espírito vai sendo aliviado. Perdão por descontar em vocês, caros leitores, mas o alívio é tão recompensador quanto ao de um antidepressivo (digo isso sem ter sequer a noção dos efeitos de antidepressivos, felizmente) E o melhor: não gasto sequer um centavo.

No decorrer de minha construção enquanto ser humano, sempre busquei utilizar as peças da mais perfeita qualidade: ética, bom senso, humanidade e sensatez. Infelizmente, o ambiente a qual fazemos parte insiste em desconstruir algo já solidificado. Daí provém o sentimento inevitável de revolta e frustração.

É necessário vestir as máscaras e buscar adaptação. Afinal, tudo na vida tem alguma razão de ser. Razão que às vezes levamos uma eternidade para descobrir e compreender. O que sei é que, para me encaixar no mundo, devo compreendê-lo. Algo que venho tentando desde quando nasci.

Quando era criança, nas aulas de matemática, a professora fazia o seguinte jogral: “Tinha cinco vacas, morreram duas, quantas ficaram?” Eu não queria saber de números! Meu desejo era desvendar o mistério por detrás da morte das pobres vaquinhas; o motivo que as levaram à óbito. Pragmatismos, jamais me convenceram. Por isso às vezes é tão complicado me adaptar a determinadas exigências...

sábado, 16 de abril de 2011

Semana Santa: De como faço memória de um tempo bom que permanece vivo em mim...



Inicia-se a Semana Santa. É o momento no qual fazemos memória da entrega de Jesus em nome de seus irmãos e irmãs. Revivemos e experimentamos, por meio dos cinco sentidos, a maior prova de amor que um simples homem já teve para com a humanidade. Durante as diferentes fases de minha vida, desenvolvi diversos olhares acerca dos acontecimentos que envolvem a semana santa, sempre procurando inseri-los à realidade a minha volta.

Como liturgia é vida e vida é memória, a Semana Santa tem para mim cheiro de nostalgia. Ainda me lembro da época de menino, quando esperançoso, aguardava a chegada desta grande semana. Não compreendia ao certo a importância que tudo isso tinha, mas sentia que se tratava de algo grandiosamente relevante, visto que minha avó e suas amigas não falavam de outra coisa. Cresci cercado de adoráveis “beatas”, que me ensinaram a ter muito carinho às tradições de um povo. Com elas, aprendi a sentir o sabor da simplicidade dos pequenos gestos. Aprendi que tudo na vida é uma grande Liturgia. Começo a fazer memória...

Depois de muito preparo, chega o grande dia. Domingo de Ramos. A capela do bairro toda enfeitada de plantas verdes, levava aquele menino que queria ser padre a viajar em seus próprios pensamentos. Ele não entendia, mas sentia que tudo aquilo remetia a um acontecimento glorioso. Alguém extremamente importante passaria logo mais por ali, no meio daqueles coqueiros verdinhos.

Evangelho. A partir da narração, o garoto começa a pensar no fato de como o grande salvador da humanidade foi glorificado sendo tão simples e humano. Ele foi recebido com esmero pelo povo de Jerusalém, mas sua simplicidade o distinguia dos líderes da atualidade que o menino costumava ver o povo aclamar. Jesus não entrou em Jerusalém dirigindo uma Ferrari de última geração. Pelo contrário. O notável homem passava montado em um velho burrinho, enquanto o povo o aclamava com ramos. Fazer vivência daqueles gestos conduzia o pequeno garoto a um estado de catártica admiração.

Início da semana, muitos terços na casa da avó. Era a vigília que precedia a quinta-feira Santa. As simpáticas “beatas” reuniam-se em torno a uma imagem da cruz e entoavam o tradicional terço. O garoto nunca entendeu ao certo o motivo de tantas repetições. Não entendia, mas sentia. Sentia que tudo aquilo tinha uma rica razão de ser para as mulheres que ali estavam. Após a reza do terço, a vida era celebrada, acompanhada de chazinhos e bolachas...

Eis que chega a quinta-feira Santa. No folheto da missa a inscrição: “Missa da Ceia do Senhor”. Por ceia, o garoto compreendia banquete, alimentos... O gesto de se sentar à mesa e se alimentar... Ele não sabia, mas sentia. Sentia que o momento de cear com a família era a hora de partilhar vivências. Ali, na mesa, as pessoas se alimentavam umas das outras. Em um belo ritual antropofágico, as experiências de vida eram partilhadas.

O mesmo aconteceria naquela noite. Um clima especial pairava sobre a capela. As pessoas muito alegres se cumprimentavam calorosamente com abraços e apertos de mão. A celebração começa. No decorrer dela, um gesto de profunda simplicidade fazia aquele menino compreender a essência da vida. O gesto era feito pelo padre que, repetindo o que Jesus fez em sua derradeira ceia, lavou os pés de cada discípulo seu... O sonhador menino não compreendia ao certo, mas sentia. Sentia que na realidade vigente, o mundo seria melhor se as pessoas se dispusessem a lavar os pés umas das outras, ajudando-se mutuamente, acolhendo umas as outras, sem distinção, sem segregação...



Após o ritual, já no finalzinho da celebração, o clima muda completamente. A alegria branca que pairava no ar dá lugar a um ambiente roxo e triste. Chegava o momento. O grande momento no qual a igreja se veria órfã. As velas se apagavam... As toalhas eram retiradas do altar... Os refletores dos Santos apagados... Silêncio. Todos se retiravam em um silêncio ensurdecedor. O menino sentia... Sentia que aquele seria o momento ideal para refletir sobre a vida. Aquela era a hora de dialogar consigo mesmo, diante daquele que se entregou em prol da humanidade.

Sexta-feira Santa era silêncio total. Ninguém fazia absolutamente nada além de rezar, rezar e rezar. Não seria para menos, acreditava, pois, o menino, já que o povo estava fazendo memória da morte de Jesus Cristo (que o menino chamava de Papai do Céu). Naquele dia, o almoço em família era diferente. Sem muitos alardes e conversas, saboreavam o bacalhau da sexta-feira santa... Seguido deste ritual, todos se dirigiam à capela... O menino sentia que algo iria acontecer... Um misto de dor e esperança estava presente... Uma ausência cheia de presença era celebrada...



Sábado Santo. As cores estavam diferentes. O clima de dor deu lugar à esperança! Ele não entendia, mas sentia... Sentia que naquela noite, alguma coisa importante aconteceria na igreja, que já estava sendo preparada para a missa da noite. Muitas flores e perfumes davam um toque especial...

À noite a celebração. O menino não sabia o porquê, mas sentia que a felicidade das pessoas era motivada pela superação da dor do dia anterior. As mulheres comentavam que Cristo havia ressuscitado! Naquela bela noite, muitas luzes, muitas cores, muita esperança... Era a memória da grande vitória: a vitória da vida sobre a morte! Portanto, não seria para menos a beleza daquela demorada missa. Tudo foi preparado com muito empenho e carinho, o que fazia o menino sentir... Ele sentia... Sentia... Sentia... E continuou sentindo até os dias de hoje...

Hoje este menino cresceu e passou a compreender...Desenvolveu ideias e buscou conhecer a fundo aquilo que a simplicidade das beatas do bem o fez amar. Hoje ele compreende que a vida é uma grande memória e que devemos ter orgulho de nossas tradições. Compreende que tudo na vida é rito que deve ser vivido e experimentado... Compreende que Liturgia é a Liturgia da vida... E que tudo se relaciona mutuamente como em um grande concerto musical... Sintonia...

sexta-feira, 8 de abril de 2011

7 de abril de 2011: Ainda resta esperança?


Episódios como o ocorrido no dia 7 de abril na escola municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na zona oeste do Rio de Janeiro, ultrapassam qualquer possibilidade de questionamento. Ao me deparar com a notícia, fiquei estático por alguns instantes. Sem perceber vieram as lágrimas, bem lá do fundo, instigadas por um misto de horror, lamento e decepção. Mediante ao caos, pensar com a razão é impossível. Imaginar o que pode levar alguém a cometer chacinas como essa acaba por gerar revolta, induzindo-nos ao pensamento de que “nada justifica”. Principalmente em alguém, como eu, que acredita em possibilidades de mudanças.

Ao ler sobre o perfil do assassino, percebo que ele foi vítima de um sistema excludente. No entanto, dentre as inúmeras possibilidades de escolha que a vida nos apresenta pelo livre arbítrio, escolheu o pior caminho: o da destruição.

Fico imaginando a imensidão da dor que toma conta dessas famílias brasileiras e tento me colocar na condição delas. Mas isso é em vão. A dor dessas pessoas é tamanha que supera qualquer possibilidade de alguém senti-la. Apenas imagino, depositando nas orações e no silêncio minha solidariedade.

como cenas de um filme, vêm a meu pensar imagens do cotidiano. Como teria sido o momento em que essas crianças saíram de casa para irem à escola? Os coraçõezinhos cheios de esperança e vontade de aprender e buscar conhecimento para ser alguém na vida. Os olhos focados na possibilidade de crescimento... O café da manhã em família... O abraço apertado e as bênçãos recebidas dos pais... A expectativa do retorno a casa para contar a família tudo o que foi visto na escola... Imagino a luz que irradiava nos inocentes corações.

Mas a luz foi apagada. Veio o frio, o medo, a incerteza. Os gritos felizes e esperançosos deram lugar a gritos desesperadores. De forma trágica, foi dado um ponto final na trajetória desses pequeninos. Caos. A correria nos corredores da escola, que normalmente é motivada pelo anseio de chegar primeiro a sala de aula, foi substituída por correrias com o fim de salvar a vida e acordar ileso no dia seguinte...

Mas, mediante as trevas, consegui visualizar o brilho de uma luz, presente na solidariedade das pessoas, que não cessaram esforços para dar um pouco de alento às vítimas e familiares.

Em uma reportagem a repórter pergunta a uma garotinha que escapou da tragédia se ela gostaria de voltar à escola no dia seguinte. A menina responde que sim: “Quero fazer faculdade e me tornar bióloga”. Aí está a esperança de ressurreição, a imagem viva de que um novo mundo pode ser possível. Ainda é possível que nasça uma flor...

domingo, 3 de abril de 2011

Espelhos da Alma


Um olhar transborda de significados. Como espelhos, os olhos refletem as profundezas da alma. Olhares são capazes de cativar e demonstrar o estado de espírito de cada um/a. Para os que sabem interpretá-los, os olhares dispensam palavras. É tarefa árdua traduzir um olhar. Esta tradução requer doses de sensibilidade e autoconhecimento.

Aquele olhar, em especial, pegou-me em um ímpeto de distração e arrastou-me para dentro. Naufraguei no mar atordoado daqueles olhos cheios de mistério. Quase me afoguei. Fui tentado a desvendá-los milimetricamente. A sedução daquele singelo olhar era capaz de superar até mesmo os encantos de Afrodite. Em um convite tentador, me fez mergulhar em um mundo repleto de significados, significâncias e vivências. Quis explorá-los a fundo, mas frustrei-me. O ser humano é um ser de grandeza incomensurável e, portanto, incapaz de ser compreendido em sua totalidade.

O encanto talvez tenha se originado do fato de que, de tão cristalinos, aqueles olhos faziam refletir minha própria imagem. O ser humano carrega em si fortes doses de um narcisismo extremo. Seria hipocrisia dizer que não somos fascinados por nossa própria imagem. Enxerguei a mim mesmo ao me prostrar defronte àqueles olhos amendoados e amedrontados. Olhos de paz, aconchego e acolhida... Olhos reveladores...

Aqueles olhos... O que será que já presenciaram? Pode ser que foram lentes de intensos acontecimentos, registrando fatos que estavam lá, guardados na memória daquela pessoa detentora de tão fascinante e intenso olhar. Pelos olhos, aquele ser era o que era... Pelos olhos, sua vida tinha significado. Os olhos ajudaram a ser quem era e continuaria a ser elemento primordial para a continuidade da construção do ser... Um simples olhar... Uma janela para a alma...


Membros da Paróquia Imaculada Conceição participam de Escola de Liturgia


Liturgia combina com arte, beleza e mistério. Uma parte nós fazemos e a outra nos é dada. A frase de Rubem Alves expressa com propriedade o verdadeiro significado da ação litúrgica em nossas vidas. Em resumo, Liturgia (Lit = Povo. Urgia = Ofício, ação, trabalho) é o conjunto de ritos que expressam determinada crença, independentemente da religião. No entanto, é difícil expressar com meros conceitos o significado de algo tão grandioso. Neste sentido, aconteceu entre os dias 25 e 27 de março, no Instituto Teológico de Lins – ITEL, a 1ª etapa da Escola de Liturgia organizada pela Rede Celebra – CNBB e ITEL. A Escola de Liturgia está em sua 4ª edição.

Representantes de diversas pastorais das Paróquias Imaculada Conceição e São Brás tiveram a oportunidade de estarem presentes e entrar em profundo contato com os elementos que envolvem a Liturgia Cristã, descobrindo um novo olhar sobre o que é a celebração da vida e os mistérios que a envolve.

O curso é assessorado pelo Padre Laudemiro Borges (Pe. Mirim), Ir Penha Carpanedo, (PDDM) e pelo compositor da CNBB Eurivaldo Ferreira, que é autor de duas músicas da Campanha da Fraternidade 2011.

Durante os três dias, os assessores utilizaram a metodologia, ou melhor, o caminho, da construção do conhecimento em conjunto. Proposta por Paulo Freire, esta metodologia consiste em dar voz ao povo, de modo que o conhecimento seja experimentado, compartilhado e que todos tenham voz e vez. Com danças circulares, acolhidas calorosas, contato humano, construção do mapa da vida, miniplenárias, vivências, leitura orante da Palavra e celebrações, os assessores motivaram os participantes a perceberem que tudo é conteúdo que garante aprendizado.

Os participantes também foram orientados a se precaver contra os perigos que podem envolver os ritos. Dentre estes riscos está a possibilidade de se transformar em ritualismo carregado de sentimentalismo, no qual o comportamento dos participantes passa a ser mecânico. Descobrimos que a verdadeira liturgia deve estar em sintonia com o universo à volta; o mistério se esconde no que há de mais singelo e a celebração da liturgia parte de dentro para fora.

Todos os ensinamentos foram concretizados por meio de celebrações do Ofício Divino. Para muitos participantes, esta tradição milenar foi novidade. A expressão da essência da fé encantou a todos, que celebraram em verdadeira unidade, desenvolvendo uma Liturgia rica em beleza, significado e espiritualidade. Uma Liturgia viva, Libertadora, feita pelo e para o povo. Liturgia essa que tem como principal centralidade o mistério pascal de Cristo! Quando nos reunimos em assembleia, assumindo nossa identidade de batizados e de povo sacerdotal, devemos sempre fazer memória da Páscoa do Senhor, celebrando nele nossa própria páscoa, nossa passagem da morte para a vida, afirmando que existe a constante presença da “páscoa de Cristo na páscoa da gente e páscoa da gente na páscoa de Cristo”!

Bandeira

Para simbolizar o ideal comum de todos os participantes, será construída no decorrer das etapas a bandeira da Escola de Liturgia 2011. No início do encontro, todas as cidades se reuniram em grupos e “tatuaram” seus nomes em pedaços de panos coloridos. Juntas, cada parte dará consistência a um todo maior, que será apresentado na bandeira. A equipe de Birigui será a responsável por dar início a esta construção. Ao término de cada etapa uma cidade ficará encarregada de dar continuidade à marca da Escola de Liturgia 2011. Trouxemos desta primeira etapa: Amor, Partilha, Alegria, Unidade, Aconchego, Transformação...

Diuan Feltrin – PASCOM - Colaborou Vinicius Schumaher - Votuporanga

domingo, 20 de março de 2011

Leite e Mel

Às vezes penso que o mundo seria menos conturbado se o transformássemos em poesia. Se buscássemos em nosso íntimo a essência de nossos sentimentos e tivéssemos coragem e ousadia de extrair beleza dos momentos conturbados, seria mais fácil viver. No entanto, infelizmente a tendência típica do ser humano é colocar mais água onde a enchente já submergiu, aumentando assim o caos. A tranquilidade é uma virtude difícil de ser encontrada, pois se esconde em nós mesmos, em algum lugar inóspito. De tão inóspito, chega a ser aterrorizante pensar em explorá-lo.

Não é exercício fácil de ser feito, porém é necessário que saibamos silenciar nossos corações a fim de tentar entrar em contato com nosso eu interior. O silêncio faz bem, é terapêutico. Ao contemplar o silêncio, temos a capacidade de praticar as mais sublimes experiências. Somos capazes de nos desprendermos de nosso ego, buscando alcançar um novo jeito de ser.

Os diferentes estágios da vida exigem transformação e não é novidade para ninguém que tudo o que é novo gera certa apreensão. É normal temer o desconhecido. Todavia, é conhecendo o novo que nos desprendemos de ideologias enraizadas, mesquinhas e maniqueístas. O verdadeiro sábio é aquele que possui a convicção de que seus ideais são efêmeros, a ponto de serem transformados quando se tornarem obsoletos, dando espaço a outra forma de pensar.

Vivenciamos um período no qual a sede pelo conhecimento se tornou realidade. O povo passou a querer ter voz e vez nas tomadas de decisões capazes de modificar a realidade. Felizmente os algozes repressores, aqueles que detêm a maior camada do bolo social, estão perdendo espaço. A pedagogia do oprimido, utopia de Paulo Freire, vem se concretizando conforme o tempo passa.

Sonho com o dia em que as relações serão pautadas no respeito mútuo. Sonho com o momento em que poderemos encontrar a “terra prometida”, em verdadeiro processo de êxodo, rumo a terra onde jorra leite e mel. Nesta terra, mundo sonhado por mim e por tantos e tantas, tudo seria embasado no sonho louco dos poetas, no qual tudo gera beleza: as tristezas, as dores e, principalmente, as alegrias.

É no silêncio que eu, arquiteto de mim, desenho este novo mundo... Porém desperto: algo acontece lá fora. Saio de minha torre de marfim e volto à realidade. Lá no recôndito de meu ser prevalece uma pequena brasa esperançosa, prestes a incendiar-me por completo...


Sonhos e ideais estão refletidos também na arte... Preste atenção nesta belíssima letra: "Eu... Caçador de mim". Caço-me a todo instante...


quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

De como mudei o percurso...



No clássico romance “Dom Casmurro”, Machado de Assis faz uma interessante observação quando afirma que é possível “ligar uma ponta a outra da vida”, no caso da obra, infância e velhice. Isso me fez pensar que a vida passa depressa e que viver é um grande desafio. Desafio árduo, na maioria das vezes.

De uns tempos para cá, tenho percebido que sei muitas coisas na teoria. Sei passar longas e cansativas lições de moral nas pessoas a minha volta. Vira e mexe vem alguém fazer uso de meus dons de psicólogo sem formação em Psicologia. No entanto, sou um teórico que possui extrema dificuldade em aplicar simples conceitos na prática.

A fórmula de meu sofrimento é mais complicada do que uma equação matemática. Tente entender, o motivo de minhas angústias encontram-se sempre no fato de ter que fazer escolhas que poderão incidir diretamente em algo já consolidado na minha vida.

São dois caminhos a seguir. Distintos em si, mas que podem transformar meu percurso. De um lado, aquilo que sou. Do outro, aquilo que posso vir a ser. Neste caso, uni duni tê não resolve. A emoção, tampouco. Preciso agir com uma razão fora do comum. Resultado: possibilidade de sucumbir em angústia!

No entanto, uma luz sempre me guia. A resposta está em mim, cabe parar, refletir, saber ouvi-la e compreendê-la. Desta vez a voz que daria a resposta berrava dentro de mim, mas eu fingia que não a escutava. O que me preocupava em atender ao clamor daquela voz era o que as pessoas ao meu redor iriam pensar. É típico do ser humano depositar expectativas nos outros. Tanto é que, de tanto se preocupar com a vida alheia, determinadas pessoas esquecem-se de viver. Machado também fala sobre isso quando relata que a mãe de Bentinho preconizara o futuro de seu primogênito antes mesmo deste nascer, prometendo aos deuses metê-lo no seminário.

Mas ganhei coragem e decidi ouvir a voz de meu coração (a voz que vem da alma) e não os murmurinhos do mundo afora.

Simplesmente adiei alguns planos. Na verdade, meu objetivo foi dar lugar a outros muitos planos que há tempos sonho em colocar em prática. Quem realmente me entende, aceita. Quem não me atende, pode pensar que sou tolo ou algo assim... Paciência. Apenas eu e somente eu sei o motivo de minha escolha. Uma coisa é certa: não desisto facilmente de meus sonhos... E são muitos!

domingo, 6 de fevereiro de 2011

A Burocratização da Vida

Confesso que possuo certa dificuldade com relação à burocratização da vida, acentuada pelo advento da mercantilização do ser humano. Na estúpida ótica capitalista, as pessoas passaram a ser vistas como meras geradoras de lucros e prejuízos. Enquanto isso, a dimensão humana de cada um cai no esquecimento. Daí provém a triste realidade: em alguns lugares, as pessoas são enxergadas como máquinas produtoras.


Para sobreviver no mundo em voga, é preciso que tenhamos certo “jogo de cintura”. Caso contrário, somos cortados pela raiz. Cabe-nos então vestir a máscara e aderir ao sistema. É muito simples, porém, paradoxalmente, árduo ao extremo. Durante todo o dia somos obrigados a vestir uma carapuça que esconde o que realmente somos. A partir daí, toda uma ideologia construída no decorrer de anos, passa a ser ocultada, dando lugar a uma personalidade diferente que parece ser controlada por controle remoto, visto que repete dogmas de forma metodologicamente compulsiva.


Infelizmente é necessário se adaptar, por mais difícil que seja. Tenho certa dificuldade em ignorar a dimensão humana dos fatos e considerar as pessoas apenas como bonecos manipulados que geram lucros.


Ao que parece, considerar a condição humana dos seres humanos é atributo de estudiosos de ciências humanas. Infelizmente os estudiosos das exatas foram condicionados a comportarem-se como máquinas e, por consequência, consideram o mundo a sua volta como tal. Longe de externar preconceitos. Não se trata de visão preconceituosa aquilo que experiências empíricas comprovam.


A sensibilidade das pessoas é expressa quando estas demonstram a capacidade de ler bons textos, ouvir boas músicas, assistir a bons filmes... E não simplesmente a lidar com números, valores e fórmulas... A essência humana é subjetiva, portanto, compreendê-la é privilégio de poucos.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Histórias de vida...


Estou de volta!!! E retorno com as histórias provenientes de observações do cotidiano... O fato que segue, resulta de um momento especial.


A velha boneca...


Seu rosto carregava as marcas do tempo, mas seus sentimentos ainda giravam em torno de um sonho de menina. Ela tinha pouco mais de sessenta anos, no entanto, seu desejo era comum ao de meninas de pouca idade. Seu sonho de consumo era possuir uma boneca! Não importava a marca. O que queria era apenas ter a satisfação infantil de segurar no colo um bebê de mentira.

Seu rosto carregava as marcas da opressão. Ela, desde os oito anos, trocara as brincadeiras infantis pelo peso da enxada. Trabalhava com afinco na lavoura com o intuito de contribuir com o pão de cada dia. Enquanto suava, cantava com sua doce voz que conquistava a todos Não sei dizer se ela simpatizava com o ofício. Só sei que o fazia unicamente para escapar dos solavancos dos pais. A mísera renda conquistada diariamente era depositada em sua totalidade nas mãos calejadas de seus progenitores. Aquela pobre menina jamais conhecera os deliciosos sabores da infância. Talvez isso justificasse seu estranho desejo de, na velhice, possuir uma boneca.

Seu rosto carregava as marcas da felicidade. Sim. Clandestina, mas era felicidade. Uma espiritualidade tentadora ornamentava sua delicada tez. Todo o motivo daquela força radiante provinha de sua íntima ligação com Deus. Seus joelhos calejados em frente à imagem de Imaculada Conceição acompanhavam o delicado derretimento das velas compradas na mercearia da esquina. Talvez a luz que emanava daqueles pavios escondia algo mais profundo. A cera derretida talvez fosse resultado de toda a dor que aquela vida lhe proporcionava. Mas preferia irradiar como a luz do pavio, e ignorava a cera derretida.

Seu rosto carregava as marcas de um tempo que passa. E como passa. Casou-se, foi subserviente ao marido, como sempre aprendera a ser. Teve filhos, educou-os da mesma forma rígida como fora criada. Os viu crescer. Teve netos. Educou-os, de forma já não tão rigorosa como outrora, visto que carinho de avó é algo mais doce e grandioso. Viu os netos crescerem, graduarem-se e partirem. Viu seu marido partir para outra dimensão... Chorou. Percebeu que a vida é um ciclo que se repete...

Seu rosto carregava as marcas da sabedoria. Sabedoria com a qual aprendi a ser sábio. Sabedoria que me fez ser quem sou e acreditar na simplicidade da vida. Algo que me fez valorizar a simplicidade de pequenos gestos.

Hoje, a presenteei com uma simples bonequinha desprezada no camelô da esquina. Tão feia e fora de moda a pobrezinha que ninguém a olhava há anos, mas, não sei porquê, seu olhar me cativou. Resolvi dar de presente como forma de gratidão àquela mulher que me ajudou a construir meu Eu. Seu rosto carregou então, novamente, as marcas da felicidade...

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011


Como sempre digo, admiro a simplicidade das coisas. Neste primeiro post de 2011, não publicarei um texto meu. Mas compartilho com vocês a singela produção de meu amigo poeta Rômulo Gomes, que mora lá no Nordeste. O texto dele me fez sentir gosto de saudade... Apesar das diferenças entre uma criança do nordeste e outra do interior de São Paulo, vejo muitas coisas em comum, sendo a principal delas a capacidade de sonhar...

O tempo vem passando depressa. Olho para trás e vejo, já distante, aquela figura de menino tímido... Ele virou homem... Sinto sabor de saudade...



Gosto de Infância

Minha infância tem sabor do ciriguela tirado do pé antes do tempo para amadurecer mais rápido.

Tem sabor da manga verde com sal e melancia madura que vovô plantava no quintal.
Tem sabor da bolacha que vovó assava no leite, às vezes só na manteiga, meu café da manhã preferido.

Tem sabor da chuva que caia no fim da tarde.

Tem sabor da amarelinha que pulava no chão ainda ensopado em frente de casa depois do fim da chuva.

Minha infância tem sabor das reuniões familiares em volta da minha avó encima do pilão quebrando castanhas pra fazer a receita da família: doce de castanha de caju, hummm.

Tem sabor de acordar mais tarde no sábado e ir correndo pra frente da televisão preta e branca que só pegava a Globo, mas que era suficiente, pois a Xuxa me fazia viajar junto com ela.

Tem sabor das compras de fim de mês, onde vovó fazia a feira e me trazia balas, bolachas recheadas, um prazer a cada trinta dias.

Tem sabor das ventania que aparecia do nada quando mamãe terminava de varrer e passar o pano na casa de cimento grosso.

Tem sabor da água “doce” da barragem, única fonte que podíamos ter naquele momento.
Minha infância tem sabor das viagens com minha avó ao banco para tirar sua aposentadoria, onde eu ferozmente guardava seu lugar na fila, observava tudo e descobria o ambiente.

Tem sabor das férias de fim ano que logo dava saudades da escola e era tomado pela ansiedade de comprar o caderno novo na mercearia.

Tem sabor das brigas por motivos bobos de meu avô, que toda a rua de chão batido tomava conhecimento.

Tem sabor da minha primeira bicicleta (de adulto) roxa e nada moderna, mas que pra mim representava muito mais.

Tem sabor das fazendas, dos apartamentos, dos bares e restaurantes que minha imaginação criava no quarto da minha avó, quando todos dormiam depois do almoço.

Minha infância tem sabor do fim de tarde, quando ia pra casa da minha outra avó e pedia morrendo de vergonha um real ao meu avó que hoje não está mais comigo.
Tem sabor da roupa nova que essa mesma avó, na verdade bisavó, comprava pra mim no mês de outubro, mês das festas do padroeiro.

Tem sabor da rede estendida no meio da área ventilada, onde nos balançávamos sem compromisso.

Tem sabor do arco-íris que se formava na serra em frente de casa depois da chuva.
Tem sabor do barulho da água do rio que dava pra ouvir da calçada quando chovia forte no inverno.

Minha infância tem sabor da goteira que insistia em aparecer todos os anos.
Tem sabor do barulho fechado dos trovões e do medo de cair um raio pertinho dali.
Tem sabor da falta de luz, geralmente nos dias chuvosos, onde corríamos pra acender as velas e dormir mais cedo.

Tem sabor da novela da tarde do Vale Apena Ver de Novo, adorava assistir depois do Vídeo Show, eu não perdia.

Tem sabor das minhas caixas (literalmente) de livros, revistas e fotos de pessoas famosas que via na TV, guardadas comigo até hoje.

Minha infância tem sabor das fogueiras de são João que enchia a casa de fumaça e os olhos de vermelhidão.

Tem sabor do milho quente que nem sempre virava pipoca na panela de barro da vovó.
Tem sabor das manhãs onde plantávamos milho e feijão no roçado do quintal de casa, eu sempre quis participar.

Tem sabor da cadeira de balanço que era disputada por todos na calçada de ventilada .
Tem sabor de ir correndo pra o orelhão ver se os cartões que ganhara ainda tinham unidades – princípio de modernidade pra mim.

Tem sabor do bolo de aniversário feito em casa por minha mãe, com granulados coloridos e vela feita por mim mesmo.

Minha infância tem sabor das comemorações de domingo, com um refrigerante, um litro de pitu e um monte de copos na mesa – observava tudo, inclusive como se transformavam depois de beber umas e outras.

Tem sabor do molho do macarrão que eu sempre fazia e todos pareciam gostar, era o primeiro a “beliscar”.

Tem sabor da coalhada que era preparada desde à tardinha, e eu ainda acrescentava cuscuz de milho.

Minha infância não tem sabores importados ou exóticos, tem sabor da infância de qualquer criança pobre do interior do nordeste brasileiro. Criança que sonha como todas as outras, vai a escola, brinca, arenga. Criança que cresceu e por força maior, hoje volta aos tempos de criança e descobre que era feliz.


por Rômulo Gomes - Acadêmico do 6º período do curso de Letras da UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE - UERN