domingo, 24 de maio de 2009

Desgraçadamente repulsivos


Um soco no estômago. Asco, mal-estar. Uma confluência de sensações que variam do nojo ao lirismo. A mente se confunde. Escárnio e sensualidade se misturam de maneira jamais vista na história do cinema mundial. O filme “Saló ou os 120 Dias de Sodoma”, dirigido pelo mestre italiano Pier Paolo Pasolini, está a anos-luz do cinema convencional de Hollywod. 

A obra idealizada em 1975 gerou repulsa na sociedade italiana, sofrendo intensa censura por parte das camadas conservadoras. Não seria para menos. Pasolini tinha por meta escancarar a sociedade fascista orientada por prazeres, tortura e humilhações em diversas facetas. Se o objetivo era chocar, podemos dizer que o diretor o conquistou. Em uma catarse explícita e incômoda, o filme extrapola o campo das ideias, fazendo que o impacto também seja sentido no estômago. Blockbusters ao estilo “Jogos Mortais” não passam de contos de fadas se comparados a “Saló”.

 Ano de 1944. A província italiana de Saló está dominada pelo fascismo. Representantes do clero, nobreza, justiça e política resolvem recrutar dezesseis jovens exemplares e perfeitos para passar uma jornada vivendo em um palácio isolado no Marzabotto, juntamente com guardas, criados e garanhões. Além deles, quatro mulheres de meia-idade acompanham a jornada. 

Os jovens selecionados seriam contemplados a viver um circo de horrores, servindo aos desejos escatológicos e animalescos dos representantes do poder. Submissão. Depravação. Sexo. Violência. O grupo é forçado a satisfazer os porcos desejos de seus superiores. A tortura não se restringe somente à aspectos físicos. Além da submissão, são forçados a ouvir as pervertidas histórias diabolicamente narradas pelas damas de meia-idade ao som infernal de um piano. Os contos serviriam de estímulo para a consumação dos patológicos prazeres carnais.

Durante a estadia no palácio, os jovens passariam por três círculos: o Círculo das Manias, o Círculo da Merda e o Círculo de Sangue. Nada é mais repugnante do que o círculo da merda. Utilizando o argumento de que a dor somada a sujeira aumenta a satisfação e o prazer, os algozes obrigam seus súditos a saborearem, deliciosamente e com bom apetite seus próprios excrementos. A expressão mangiare é difícil de ser esquecida. Humilhação sem precedentes na vasta história do cinema. 

Focado em teorias de mestres como Foucalt e Nietzsche, Pasolini ressalta polêmicas teorias como a transgressão de valores e dignidade humana. Não surpreende o fato de alguns jovens recrutados pelos torturadores fascistas demonstrarem carinho pelas criaturas opressoras, a ponto de se sentirem satisfeitos em servir como objeto de prazer. Um filme estarrecedor, alarmante e que, acima de tudo, leva a pensar sobre o mal intrínseco a espécie humana. 

Saló - Itália/França, 1975, Drama, 18 anos

2 comentários:

Rafael Lopes disse...

é bem louco o filme mesmo heim.

Cada um tem sua loucura neh. O do escritor foi criar isto.

Paciência.

Nem quero ver o filme, rs

abraço

Roberto de Barros disse...

Esse filme é na verdade uma OBRA DE ARTE! Pasolini foi fantástico. Sim!!, o FILME É FORTÍSSIMO, mas o Marques de Sade estava relatando exatamente a experiência que ele conhecia perfeitamente desse período. Esse FILME É EXCELENTE, mas tem que ter estômago, pois são cenas fortíssimas.

Parabéns Diuân, mas uma vez, PARABÉNS!!!